Caros colegas
Achei muito interessantes as conversas de hoje no yoga e a grande diversidade de formas de pensar que temos. Resolvi partilhar mais qualquer coisa sobre a minha. Achei piada à vergonha da Margarida. Eu tenho mais vergonha de falar em ambientes sem tensão...
Nunca fui religioso e acho que via isso como uma vantagem. Como se tivesse mais possibilidades em aberto. Recentemente parece-me mais uma incapacidade de optar, de acreditar numa das meras hipóteses existentes.
A prática do yoga produz sem duvida um maior bem estar físico e uma maior tranquilidade. No entanto o yoga não é para mim uma religião ou um sistema filosófico completo. De facto, acho até que uma consequência natural da prática do yoga pode ser um maior apego ao corpo, que inevitavelmente vai ficar velho, doente e morrer. É evidente que uma possibilidade que temos é ficarmos contentes com a nossa saúde e procurarmos as mais diversas distracções. No entanto esta possibilidade parece-me por vezes uma desistência. De algum modo é desistir de viver a vida em pleno.
Devido ao meu desinteresse geral pela religião nunca dei qualquer atenção ao budismo, até que há pouco tempo vi um programa de televisão sobre a vida do Buda. Fiquei tão fascinado pelo budismo que comecei a ler sobre o assunto e achei mesmo que era uma boa religião para mim. Uma religião sem deus, que diz apenas que todos os seres sofrem e desejam alívio para o seu sofrimento. E que propõe um caminho, baseado apenas na meditação, para acabar com o sofrimento e ser feliz. O yoga pode, neste contexto, ser visto apenas como uma preparação do corpo para a meditação budista. Não me identifico com as filosofias mais antigas associadas ao yoga e é o "yoga budista" que mais me interessa. Foi o que me trouxe para as aulas de yoga.
Esta história teria um final feliz se não fossem os renascimentos. Não há deus mas há os renascimentos! Como é que eu vou acreditar nisto? Bom, se calhar não vou. Nem acredito mesmo que as pessoas têm tendência natural para o "bem". No entanto é um facto que as pessoas têm tendência natural para viver em conjunto. E, talvez apenas por viverem em conjunto, sentem-se bem ao cultivar sentimentos positivos como o amor e a compaixão. O "budismo sem renascimentos" é pelo menos uma teoria muito simples que podemos utilizar para afastar estados mentais negativos desagradáveis e nos tornarmos "melhores pessoas" e mais felizes. É gratificante pensar que o que fazemos é para ajudar os outros, ainda que por vezes o nosso contributo seja de facto pouco significante.
A minha forma de meditar é muito simples. Fico apenas sentado em qualquer lado com a coluna direita e concentro-me na respiração. Por vezes não passo daqui. Quando consigo algum sossego, começo a procurar sentir-me como semelhante às outras pessoas, a procurar sentir o seu sofrimento e a cultivar por elas um sentimento de compaixão (não tem nada a ver com pena). Às vezes começo a concentrar-me numa pessoa de cada vez, nas pessoas que me vêm à cabeça, que conheço ou imagino, independentemente dos sentimentos que tenha por elas. Isto feito a sério pode ser muito forte e confesso que já me fez chorar. Mas é clara a sensação de bem estar resultante da amplificação dos melhores sentimentos que temos. Tenho até uma espécie de mantra preferido: "inspirar sofrimento, expirar compaixão" (M-i-s-ex-co) - uma frase que li em qualquer lado.
Ultimamente ando num estado contemplativo, sem pressa, consciente da impermanência de tudo, de como é natural sentir insatisfação, da inexistência de objectivos, e de que há apenas uma sucessão de estados mentais que eventualmente se irá extinguir com a morte. No entanto, o "budismo sem renascimentos" faz-me sentir esperança de conseguir vir a aceitar as coisas tal como são e ainda assim ser feliz, acabar com o sofrimento sem lhe fugir. Gosto mais das pessoas, muito mais de algumas do que de outras é certo, mas cada vez mais consigo olhar para os aspectos positivos de cada um, ver os outros como essencialmente semelhantes e manter quase sempre uma atitude positiva. Estou convencido de que o yoga e o budismo vieram para ficar...
Ufa, escrevi isto tudo? Será que alguém leu até aqui?
Beijos e abraços
Luís